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Defensoria alerta para os impactos da alienação parental no desenvolvimento das crianças e adolescentes que vivem a violência familiar

Texto:Amanda Sobreira

Ilustração: Valdir Marte

Após um casamento de 14 anos, Neide (nome fictício), de 43 anos, decidiu se divorciar. A decisão foi tomada há 4 anos, quando ela saiu de casa com os filhos, não apenas para buscar uma nova vida, mas também para proteger as duas crianças de um ambiente familiar tóxico. O principal motivo da separação foi a constante prática de alienação parental pelo ex-marido, que, mesmo após o divórcio, continua a influenciar os filhos contra ela.

“Eu passei 14 anos casada e foram inúmeros episódios de alienação parental onde ele questionava minha maternidade ou descredibilizava minhas opiniões como mãe. E eu ainda continuo vivendo isso porque mesmo após sair de casa, há 4 anos, mesmo após o divórcio, ele continua fazendo isso. De muitas formas eu escondi o pai injusto e cruel que meus filhos tinham. Tudo que eu podia fazer pra tentar omitir, silenciar,eu fiz. Eu prorroguei muito porque eu tinha pena dos meus filhos. Eu não queria que eles vissem esse pai”, conta Neide.

Foi na pandemia que Neide decidiu se organizar para sair de casa e preservar a saúde mental da sua família. Uma maneira de mostrar para os filhos que ela estava ao lado deles, mesmo que o pai tentasse dizer ao contrário. “Foi a iminência da morte que me fez pensar se eu queria terminar minha vida naquela situação que eu vivia. Eu me preparei financeiramente e quando começamos a sair de casa, eu procurei um apartamento e me mudei com meus filhos”.

Hoje, com os filhos adolescentes, Neide ainda percebe o impacto do comportamento do ex-marido. “Sempre que me chega alguma notícia ou alguma forma injusta que o pai deles está falando de mim pessoalmente ou da minha maternidade, eu chamo eles mesmos para refletirem, olharem para a nossa realidade e eles mesmos irem percebendo que aquilo que o pai afirma, me acusa, não corresponde com a verdade. E aí eles vão tirando suas próprias conclusões”, relata.

A alienação parental é caracterizada por práticas que buscam afastar os filhos de um dos genitores, criando um distanciamento emocional e psicológico.

Para desvalorizar o outro, ex-cônjuges ou familiares falam mal e julgam o outro genitor na frente da criança. Frases como “seu pai não se interessa por você, agora ele tem outra família”, “Sua mãe não sabe de nada”, “Nem pergunte pro seu pai que ele nunca pode nada que é pra você”, se ditas constantemente irão repercutir de forma danosa no desenvolvimento infantil e podem gerar traumas que afetarão diversas áreas da vida.

No Brasil, a Lei Nº 12.318, instaurada em 26 de agosto de 2010, discorre sobre a alienação parental e aponta que ela fere um direito fundamental da criança ou do adolescente à convivência familiar saudável, além de prejudicar a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar.

A defensora pública Michele Camelo, supervisora das Defensorias de Família da capital, explica as diversas formas da prática e o que gera interferência psicológica nas crianças e uma série de sentimentos negativos constantes, como insegurança, melancolia, medo, raiva ou indiferença.

“A alienação parental ocorre na desqualificação do(a) outro(a) genitor(a), na mudança de domicílio com o objetivo de distanciar os filhos de um dos genitores, xingamentos ao(à) novo(a) companheiro(a) do genitor alienado, entre outras situações que acabam criando falsas ideias ou memórias, interferindo psicologicamente na vivência dos filhos”, alerta a defensora.

Além de conteúdos enviados por WhatsApp ou e-mail, que podem ser usados como evidências de alienação parental, a comprovação judicial deve ser multidisciplinar e passa pela realização de estudos e avaliações feitas por psicólogos. É o que explica a defensora pública Nadinne Sales, que atua no Núcleo da Defensoria em Juazeiro do Norte.

“Inicialmente é muito importante identificar e confirmar a conduta alienadora, através de estudos multidisciplinares e avaliação psicológica, a fim de que a questão seja tratada e as consequências dessa violência na saúde mental da criança alienada sejam minimizadas. Elas podem manifestar sintomas exteriores, como alteração comportamental, emocional , exteriorizando aversão ao genitor(a) alienado(a) e chegando ao extremo de, por vezes, chegar até a negar a sua existência ou afirmar seu óbito”, explica a defensora.

A Defensoria Pública do Ceará oferece assistência jurídica e psicossocial gratuita para as vítimas de alienação parental. Para casos onde é possível, a instituição oferece oficinas de mediação por meio do Núcleo de Soluções de Conflitos (Nusol), localizado na sede da Defensoria do bairro Luciano Cavalcante. Mas há casos que chegam direto para a judicialização, pelo Núcleo de Atendimento e Petição Inicial (Napi), na capital.

Caso a alienação parental seja provada e o diálogo não seja possível na construção de uma relação familiar saudável para todos os envolvidos, o responsável que se sentir prejudicado pode entrar com uma ação judicial, o que pode resultar desde a prisão preventiva e até a retirada da guarda.

A psicóloga Andreya Arruda, que coordena o setor psicossocial da Defensoria Pública do Ceará, explica que, seja por meio das oficinas promovidas durante a mediação familiar, seja nos relatórios emitidos para os defensores subsidiarem as ações judiciais, em todos os casos, o que temos em comum são os danos no comportamento de crianças e adolescentes que vivem situações de alienação parental.

“A gente costuma dizer que, em tese, nós somos 50% nosso pai e 50% da nossa mãe. Então, se eu fico dizendo que teu pai não presta, tua mãe não presta, é como se isso me ferisse intimamente, como se 50% meu também não prestasse. É importante que esses pais consigam ter a noção de que o divórcio finaliza uma relação entre marido e mulher, mas a relação de pai e mãe com os filhos precisa e deve ser continuada, até porque é direito dessa criança”, defende a especialista.

A defensora Michele Camelo, destaca, porém, que um ponto merece destaque quando o tema é alienação parental. Especialistas e estudiosos apontam que a lei foi direcionada às mulheres, em retaliação a Lei Maria da Penha, promulgada 4 anos antes. “Dessa forma as mulheres passaram a ser silenciadas, sob a ameaça de uma mudança de guarda caso os filhos mudassem de postura com o genitor, ainda que tivessem vivenciado situações de violência doméstica e fosse legítimo o medo do pai”, explica Michele.

Ao longo dos anos, diversos coletivos e conselhos se manifestam contrários à lei de alienação parental. A ONU apelou ao governo federal pela revogação da lei. Em 2022, o Conselho Nacional de Saúde, recomendou ao Congresso Nacional a revogação da lei afirmando que ela prejudica mulheres e crianças. Em 2023, a Comissão de Direitos Humanos do Senado aprovou o Projeto de Lei 1372/2023, que revoga a Lei de Alienação Parental.

“É preciso muito cuidado ao aplicar a Lei de Alienação Parental, sob pena de representar violência contra mulheres, crianças e adolescentes. Não se trata apenas de identificar uma situação de alienação, como consta no texto da lei, mas especialmente de compreender o contexto social e de gênero que envolve os acontecimentos, para que não se perpetue uma situação de violência doméstica”, destaca Michele Camelo.

Serviço:

NÚCLEO DE ATENDIMENTO E PETIÇÃO INICIAL – NAPI

Celular: (85) 98895-5513
E-mail: napi@defensoria.ce.def.br
Mensagens de WhatsApp: de 8h às 12h e de 13h às 16hs

NÚCLEO DESCENTRALIZADO DO MUCURIPE

Telefone:(85) 3101.1079 – 8h às 12h e das 13h às 17h
Celular: (85) 98902-3847 – 8h às 12h
Celular: (85) 98982-6572 – 13h às 17h
E-mail: nucleomucuripe@defensoria.ce.def.br – enviar solicitação de atendimento em qualquer horário, embora a resposta seja dada no horário das 8h às 12h e das 13h às 17h
Atendimento Presencial: somente mediante marcação por um dos canais virtuais ou telefônicos e verificada a necessidade

NÚCLEO DESCENTRALIZADO JOÃO XXIII
Celular: (85) 98889-2140 / (85) 98889-0856
E-mail: nucleojoao23@defensoria.ce.def.br

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Escrito por tvprincesavalenews

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