Em formato de pílulas, sprays nasais ou à prova de variantes: a segunda geração de vacinas contra a covid-19 está a caminho – e elas podem ser ainda melhores. O surgimento de variantes altamente transmissíveis, como a Ômicron, e a perspectiva de que o mundo terá de conviver com o coronavírus impulsionam pesquisas nessa área. Por outro lado, barreiras como a falta de insumos e até a dificuldade de recrutar voluntários atrasam resultados.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que há 140 imunizantes em fase de estudo clínico – quando a vacina é testada em humanos – e 194 em estágio pré-clínico, com testes em animais. A lista inclui candidatas brasileiras e, no caso das nacionais, a expectativa é de que fiquem prontas no início do ano que vem.
Imunizantes hoje à disposição vêm cumprindo muito bem sua função principal: prevenir o adoecimento e a morte. Apesar disso, cientistas em todo o mundo veem um campo aberto para marcar novos gols contra a covid-19.
O desenrolar da pandemia já deixou claro que as vacinas podem ser aprimoradas para reduzir infecções e transmissão. Hoje, especialmente com a Ômicron, vacinados se infectam e transmitem, ainda que em escala menor, do que não imunizados. O avanço da variante fez a Coalizão Internacional de Autoridades Reguladoras de Medicamentos convocar uma reunião para debater “estratégias de longo prazo” sobre tipos de vacinas necessárias para gerenciar a covid-19.
“Uma das razões pela qual a Ômicron é tão transmissível é que muita gente já vacinada tem o vírus (alojado) no nariz, mas é assintomático”, diz o pesquisador da Universidade de São Paulo (USP), Jorge Kalil. O cientista quer armar o organismo contra o Sars-Cov-2 antes que ele invada e se multiplique pelo corpo. Por isso, desenvolveu uma vacina de spray nasal – poucas com este método estão em teste no mundo.
“O gol final é ter uma vacina de imunidade esterilizante, aquela que gera tantos anticorpos na porta de entrada, de forma que o vírus praticamente não infecta. Mas isso é difícil de alcançar”, diz o virologista Fernando Spilki, da Universidade Feevale e membro do comitê de especialistas da Rede Vírus, do Ministério da Ciência e Tecnologia. De toda forma, tecnologias como a do spray nasal podem, se não barrar totalmente a entrada do Sars-Cov-2, reduzir o alcance, diminuindo o contágio.
E, embora não tenham efeito direto no nariz, vacinas injetáveis, no braço, também diminuem a transmissão porque evitam a replicação do vírus dentro do corpo. Essa função é melhor desempenhada à medida em que o imunizante é capaz de atacar de forma certeira a variante em circulação.
“Vamos continuar dando dose de reforço a quem perde parte da proteção, mas o ideal é conseguir vacinas melhores, inclusive para prevenir formas leves”, diz Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações. Com a Ômicron, é possível que vacinas disponíveis se atualizem para cumprir melhor esse papel – farmacêuticas já engatilharam isso.
Mutações
Outros estudos em teste miram evitar o problema das mutações, com vacinas “à prova de variantes” – mais uma meta difícil de alcançar. Uma das tentativas é da empresa americana Gritstone bio, que projetou um produto com foco nas células assassinas de estruturas infectadas pelo vírus.O CEO André Allen diz que a vacina é um primeiro passo para desenvolver um imunizante “pancoronavírus”.
Já em teste em brasileiros, uma vacina desenvolvida pelo Senai Cimatec, em parceria com a empresa americana HDT Bio Corp, aposta em alta proteção com baixíssimas doses – até 30 vezes menores do que a da Pfizer. Isso é possível porque o imunizante usa uma técnica para que o RNA – que contém informações para a síntese de proteínas – se autorreplique nas células.
Uma das possíveis vantagens seria juntar, em uma só injeção, doses projetadas para cada uma das variantes – o fato de cada dose ser pequena facilitaria, em tese, criar esse “combo” sem causar tanta reação. “A expectativa para o futuro é que essa plataforma consiga ter o RNA de diferentes variantes por causa da tecnologia de baixíssimas doses. Talvez seja possível ter uma vacina multivalente”, diz a pesquisadora Bruna Machado, líder técnica do projeto no Senai Cimatec.
Outras vacinas da segunda geração estão mais adiantadas: a da americana Novavax, por exemplo, foi aprovada na Europa. Sem usar tecnologia de RNA mensageiro, é uma aposta para convencer quem ainda resiste a se vacinar. Já contra o medo das agulhas, há propostas como a da Vaxart, na Califórnia, que criou uma vacina em forma de pílula e começou testes em humanos.
Além da possibilidade aumentar a proteção na mucosa da boca, outra vantagem seria a facilidade de transporte e administração. Desenvolvimentos de vacinas levam em conta, agora, não só o nível de proteção, mas o quanto podem melhorar as campanhas.
Novas vacinas para reforço com proteção de maior duração podem ampliar, por exemplo, os prazos para revacinação. A Agência Europeia de Medicamentos já deixou claro ao dizer, em comunicado semana passada, que aplicar doses de reforço em intervalos curtos não é uma “abordagem sustentável” a longo prazo. O reforço demanda alto investimento – e nem sempre tem boa adesão.
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