Mãe de uma menina chamada África, a terapeuta holística Amanda Maia conseguiu na justiça o direito de cultivar em casa a planta cannabis, popularmente conhecida como maconha, para uso medicinal no tratamento da filha. Hoje com seis anos, a garota tem diagnóstico de fibrose cística, uma condição genética rara, crônica e progressiva caracterizada pela ocorrência de secreções espessas e viscosas em diversos órgãos. Proferida no último dia 20/5, a decisão favorável decorreu de atuação da Defensoria Pública Geral do Ceará (DPCE).
Amanda agora poderá extrair da erva, em manuseio doméstico, o óleo canabidiol que, conforme relata, “diminui a velocidade da degradação do pulmão e pâncreas, reduz as crises de tosse e ajuda a manter um equilíbrio melhor do organismo dela”. Ou seja: África Luna ganhará em qualidade de vida e a mãe poderá, enfim, dar continuidade ao tratamento da filha sem mais lidar com desconfianças e acusações infundadas.
Moradora de Limoeiro do Norte, município do Vale do Jaguaribe, ela recorda que em fevereiro deste ano foi vítima de denúncia e chegou a ser conduzida à delegacia para informar o porquê de ter cannabis em casa. A queixa apresentada anonimamente à Polícia era a de “existência de drogas no local”. A suspeita era de tráfico.
“Sempre sofri muito preconceito por fazer esse tipo de tratamento na minha filha, até mesmo por parte dos médicos, que ainda são muito resistentes ao assunto. Mas desde sempre me incomodava bastante ela ter tantas crises de tosse, colonização de bactérias no pulmão etc. Isso quebrava totalmente a rotina dela e fazia ela faltar a maior parte das aulas porque às vezes ela também tinha que internar. Então, nossa rotina era bem voltada pras medicações”, recorda Amanda.
A terapeuta holística chegou à Defensoria Pública em Limoeiro do Norte encaminhada pelo Escritório Frei Tito de Direitos Humanos e pela Rede Reforma após o episódio da delegacia. A defensora Lívia Soares atuou no caso. “Depois de debatermos as melhores estratégias, fizemos um habeas corpus para que fosse trancada a ação penal que ela estava sendo enquadrada, do uso de drogas, e para que fosse autorizado o cultivo da cannabis na casa dela, sob a alegação da necessidade do tratamento da filha. O primeiro parecer do Ministério Público foi favorável”, disse a defensora.
Diante da vitória, Amanda revela o desejo de “fazer dessa conquista individual um motor para uma conquista coletiva e facilitar o acesso de outras pessoas ao tratamento”. Por isso, a mãe de África Luna está articulando a criação de uma entidade em Limoeiro para unir famílias do Vale do Jaguaribe que enfrentam dificuldades similares quanto ao uso do canabidiol.
Ao ver a filha melhorando com o uso do óleo, Amanda lembra a busca por diversas alternativas de tratamentos. Tudo para reduzir o sofrimento da garotinha por conta dos efeitos da doença. África Luna tem o diagnóstico de fibrose cística desde os três meses de vida.
“No início, o tratamento consistia em ela ser acompanhada por uma equipe de diversos profissionais: pneumologista, fisioterapeuta pulmonar, nutricionista…e medicações, tudo pelo SUS”, lista a mãe. “Eu achava que o canabidiol servia só para questões neurológicas, mas descobri, na conversa com um colega em 2020, que o uso do óleo poderia ser a saída para o estado de saúde da minha filha. Foi quando passei a pesquisar e a estudar o assunto. Vi ali uma grande oportunidade de melhorar a saúde da minha filha”, reconstrói Amanda.
Após buscar especialistas e de posse das receitas para o tratamento da filha, Amanda conseguiu autorização da Anvisa para a importação do medicamento. Assim, com a ajuda da família, a mãe custeou a administração do óleo por conta própria durante alguns meses, período esse classificado por ela como “os melhores meses de vida da criança”.
Porém, para o tratamento continuar na dosagem médica indicada, seria necessário pelo menos um frasco do medicamento por mês, o que exigiria um investimento de quase R$ 50 mil por ano, algo inviável para a realidade da terapeuta, pois a África se alimenta exclusivamente de uma dieta especial, condição definitiva também imposta pela doença.
Incansável na busca pelo melhor para a filha, Amanda procurou informações a respeito da fabricação caseira do óleo e, assim, capacitou-se em um curso sobre cultivo da erva e iniciou o plantio de cannabis em casa. Desde então, buscou assistência jurídica para conseguir decisão judicial autorizando o cultivo doméstico da planta. A pandemia do novo coronavírus (Covid-19) retardou o feito, conquistado agora com a atuação da Defensoria.
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